sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008

Conservadorismo e Liberalismo (2)

Referi aqui a ideia desenvolvida por Hayek no "Constitution of Liberty" acerca do valor não-racionalizável da Liberdade.
A "Constitution of Liberty" é o que mais se assemelha ao que chamaria de manual político pessoal. Recomendo-o vivamente a todos os que, porque concordam ou discordam, queiram conhecer melhor os argumentos liberais. Além de estar belissimamente escrito (leio o sem problemas em inglês), está disponível em Portugal numa edição da Routledge. Comprei-o na FNAC (pelos vistos está indisponível).
Escreve então Hayek no capítulo 4 (Freedom, Reason and Tradition):
While the rationalist tradition assumes that man was originally endowed with both the intellectual and the moral attributes that enabled him to fashion civilization deliberately, the evolutionists made it clear that civilization was the accumulated hard-earned result of trial and error; that it was the sum of experience, in part handed from generation to generation as explicit knowledge, but to a larger extent embodied in tools and institutions which had proved themselves superior - institutions whose significance we might discover by analysis but which will also serve men's ends without men's understanding of them.
(Sub-capítulo 4)
Ou seja, Hayek considera, muito bem, a meu ver, que a experiência resultante de séculos e séculos de vida em sociedade produziu uma série de instituições que não eram antecipáveis a priori, nem, muitas vezes, compreensíveis a posteriori.
Mais abaixo:
The antirationalist tradition is here closer to the Christian tradition of the fallibility and sinfulness of man, while the perfectionism of the rationalist is in irreconcilable conflict with it.
Há aqui uma questão, não nego, que é da quais as tradições/instituições boas, quais as más, e como saber quais as que são benéficas, logo a manter, quais as prejudiciais, logo a eliminar. (Igonoremos aqui o facto de nem todas as tradições/instituições terem só efeitos positivos, nem só negativos, nem os mesmo efeitos sob todos os indivíduos). Ora o que Hayek afirma é que numa sociedade livre isso não tem que preocupar o colectivo, apenas o indivíduo que escolhe para si como decide viver.
It may well be that a nation may destroy itself by following the teaching of what it regards as its best men, perhaps saintly figures unquestionably guided by the most unselfish ideals. There would be little danger of this in a society whose members were still free to choose their way of practical life, because in such a society such tendencies would be self-corrective: only the groups guided by "impractical" ideals would decline, and others, less moral by current standards, would take their place. But this will happen only in a free society in which such ideals are not enforced on all. Where all are made to serve the same ideals and where dissenters are not allowed to follow different ones, the rules can be proved inexpedient only by the decline of the whole nation guided by them.
Sub-capítulo 9
Importa repetir o argumento: nenhuma nação está livre de se auto-destruir por seguir políticas erradas, ainda que bem intencionadas, que imponham um modo de vida a todos os seus cidadãos. Claro que para quem acredita que o ser humano é um ser capaz de racionalizar as instituições que melhor servem a sociedade isso pouco importa porque não iria acontecer com as instituições que idealizaram. Mas convinha lembrar que as nossas instituições não foram racionalizadas, e que foi exactamente isso que tentaram fazer Marx e Engels.

Aquilo que divide Conservadores entre Conservadores-Liberais e Conservadores-Socialistas é justamente a atitude perante a evidência, evidência que o Liberalismo reconhece e prossegue, de que o experimentado é melhor face ao desconhecido. É que Hayek também afirma:

There is an advantage in obedience to such rules not being coerced, not only because coercion as such is bad, but because it is, in fact, often desirable that rules should be observed only in most instances and that the individual should be able to transgress them when it seems to him worthwhile to incur the odiumwhich this will cause. (...) It is this flexibility of voluntary rules which in the field of morals makes gradual evolution and spontaneous growth possible, which allows further experience to lead to modifications and improvements. Such an evolution is only possible with rules which are neither coercive or deliberately imposed—(…)Unlike any deliberately imposed coercive rules, which can be changed only discontinuously and for all at the same time, rules of this kind allow for gradual and experimental change. The existence of individuals and groups simultaneously observing partially different rules provide the opportunity for selection of the more effective ones.
Sub-capítulo 6
E
(...) in such [a free] society, such tendencies would be self-corrective: only the groups guided by "impractical" ideals would decline, and others, less moral by current standards, would take their place.
(...)
The important question that arises here is whether the agreement of a majority on a moral rule is sufficient justification for enforcing it on a dissenting minority
Sub-capítulo 9
É portanto a liberdade de infrigir condutas morais e éticas numa sociedade livre (em que essas condutas são impostas por pressão social e não pelo estado) que faz as sociedades crescer e aperfeiçoar-se e as impede de se destruírem por condutas erróneas impostas.
No início do capítulo 4, Hayek cita Francis Lieber que em 1848 afirmava, acerca do conceito francês de liberdade:
The question whether this interference [by public power in society] be despotism or liberty is decided solely by the fact who interferes, and for the benefit of which class the interference takes place, while according to the Anglican view this interference would always be either absolutism or aristocracy (...)
Ou Socialismo, na minha ideia. Seja no entanto como quiseremos chamar aos que querem usar o poder do estado para impôr modelos de vida e moral aos cidadãos, é inegável que o Liberalismo é na sua raíz uma ideologia inegavelmente Conservadora.

Dos jornais

Ala liberal no CDS-PP recolhe assinaturas para ser tendência
28.02.2008

António Pires de Lima espera reunir dentro de dois meses as assinaturas necessárias para instituir uma "ala liberal" dentro do CDS-PP. Se tal não acontecer, admite que o movimento se poderá diluir.
Com a "ala liberal", o democrata-cristã pretende institucionalizar uma corrente de opinião no CDS-PP que equilibre "o carácter social cristão" que esteve na fundação do partido. "Não temos ambição de poder no CDS-PP. Será uma corrente de influência, um conjunto de pessoas que prezam muito a liberdade individual e que pensam que há um longo caminho a percorrer para libertar várias áreas da sociedade da tutela do Estado", afirmou António Pires de Lima.
"Em apenas uma semana" o site (http://www.petitiononline.com/AlaLib/petition.html) registou 169 signatários - são necessários 500 pelo regulamento dos populares. Alguns foram rejeitados e outros estão dependentes de aprovação.

Público.

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008




Cara Amiga e Amigo,
No último congresso do Partido, em Torres Novas, o Presidente do CDS, Dr. Paulo Portas, formulou a vontade de ver institucionalizadas as correntes de opinião no CDS. A sua formalização permitirá ao CDS alargar influências, organizar e estimular pessoas em função das suas ideias, valorizar o pluralismo e apostar na diferenciação para crescer. No último Conselho Nacional de 2007 foram definidas as regras a que devem submeter-se as correntes que queiram institucionalizar-se. A Ala Liberal assumiu, desde cedo, o desafio lançado pelo Presidente. A nossa declaração de principios é clara. Não queremos de maneira nenhuma pôr em causa a essência do Estado Social, embora discutamos a sua organização e eficiência. Entendemos que Portugal necessita, hoje como antes, de uma cultura de liberdade e responsabilidade que permita aos cidadãos e instituições libertarem-se da dependência infantil de um Estado que abafa a iniciativa e a liberdade sob o pretexto da protecção.Portugal precisa de um discurso e de uma prática liberal. Só o CDS está em condições de assumir esse desafio. Os outros partidos do arco da governabilidade confundem-se com o próprio Estado.Junte-se a nós. Assuma o desafio. Queremos valorizar o CDS. Assine a petição. Vai valer a pena!

Um forte abraço,

António Pires de Lima

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

O CDS liberal

Há matérias em que o CDS tem um pensamento liberal há muito. Em matéria de educação, por exemplo, a JP há muito que defende o cheque-ensino para garantir a liberdade de escolha dos cidadãos. O CDS chegou agora à mesma conclusão, ou que é de aplaudir.
Os deputados do CDS/PP partem do pressuposto de que, actualmente, a liberdade na escolha da escola a frequentar só existe para as famílias com posses. Os populares dizem que é preciso acabar com esta desigualdade de oportunidades e dar liberdade de escolha a todos.
(...)

Para o CDS/PP a ideia deste projecto é também acabar com o centralismo do Ministério da Educação e trazer as empresas para a escola.

Na minha intervenção no Congresso da Batalha procurei defender que esta medida era não só liberal (o que pelos vistos desqualifica qualquer medida aos olhos de alguns) mas também democrata-cristã. Se encontrar as minhas notas deixo-as aqui.

Pontos de contacto

Dando de alguma forma continuidade ao que o Micha anteriormente postou sobre pontos de contacto entre correntes - que hoje em dia parecem não existir, tal são algumas opiniões que por aí se vão lendo - aqui deixo um post já com uns meses de vida que publiquei no Axónios Gastos:
O liberalismo e a democracia cristã, ao contrário do que muitos possam pensar e afirmar, partilham pontos de contacto. Uns mais pragmáticos, outros mais filosóficos e ideológicos. O personalismo será um desses pontos de contacto. Este movimento humanista, perfilhado em parte pela DC, também defende a liberdade do indivíduo, o seu poder criativo, a sua singularidade e responsabilidade. Só que, em certos momentos e na "justa" medida, a DC prefere que seja o Estado a dar parte dessa liberdade e a assumir parte dessa responsabilidade. E é aí que difere do Liberalismo.Para o Liberalismo essa postura intermediária não se supõe existir. O grau de liberdade será directamente proporcional e recíproco ao da responsabilidade. E é esta equação fundamental que servirá para reger a economia, bem como a componente social. É este o cânone de uma agenda liberal, sem causas fracturantes ou imposições modais. É este o cânone que se quer num Estado, nada mais!

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Conservadorismo e Liberalismo

Algumas reacções mais violentas à minha asserção que o Liberalismo começava onde o Socialismo acaba vieram de quem se intitula Conservador e se via insultado de Socialista.
Serão os Conservadores Socialistas? Depende.
Confesso que a Ciência Política não é - ainda, porque tudo se alcança - o meu forte. Dediquei-me a ler o que pude sobre as origens do liberalismo, mas nunca perdi muito tempo com a outra doutrina que me atrai. Porque não entendo o Conservadorismo como filosofia de política pública e porque me sinto bem como Liberal-Conservador. Leu bem caro Conservador anti-Liberal, aqui o "perigoso Liberal" tem o desplante de se considerar Conservador - concedam-me que se pode ser Conservador sem acreditar Nele.
Tudo se divide quanto ao papel do estado - quem diria?. Se o objectivo é usar o estado para impôr ou beneficiar certos modelos de família, não contem comigo. Nem se o Conservadorismo é para servir para proteger certas indústrias nacionais por serem nacionais e com isso prejudicar todas as outras e os consumidores. Ou se ser Conservador é usar o Estado para impôr ao indivíduo e às colectividades certos "valores".
O meu Conservadorismo é viver e pensar de acordo com certos princípios que o tempo forjou e me permitem, com um certo grau de certeza, confiar neles sem os compreender (o perigoso liberal Hayek desenvolveu uma ideia parecida para a sua "Constitution of Liberty"). É reconhecer na minha família e no meu lar o fundamento do meu ser e pensar. É querer fundar um dia uma família dita tradicional. É ser contra a liberalização do aborto e adopção por homossexuais. E é não usar da força física e da coerção mas apenas da força do que sinto como verdade para que outros me sigam.

Socialismos

Definir o Liberalismo como anti-Socialismo é certamente redutor - até porque o Liberalismo não precisa de se definir contra outra ideologia - mas mantenho o que disse, e parece-me a forma mais simples de o fazer. Naturalmente tudo depende como definimos Socialismo.
Fascismo, por exemplo, é Socialismo.

Because the word “fascist” is often thrown around loosely these days, as a general term of abuse, it is good that Liberal Fascism begins by discussing the real Fascism, introduced into Italy after the First World War by Benito Mussolini.
The Fascists were completely against individualism in general and especially against individualism in a free-market economy. Their agenda included minimum-wage laws, government restrictions on profit-making, progressive taxation of capital, and “rigidly secular” schools.

(via)

Thomas Sowell, que escreve estas palavras, é também autor do excelente Basic Economics: A Citizens Guide to the Economy.

Guardiães do Templo

A propósito da Ala Liberal, ou sempre que se fala em liberalismo no CDS, ouvem-se acusações de de desvirtuamento do partido, como se nunca ninguém, desde a sua fundação, ou mesmo nela, tivesse inscrito o liberalismo como linha orientadora do CDS com a mesma dignidade da democracia cristã.

Não me refiro a todos aqueles que discordam do liberalismo ou que lhe apontam reservas e que, com toda a legitimidade (embora pouco acerto) procuram reduzir-lhe a influência nas políticas definidas pelo partido. Refiro-me, isso sim e não é pouco, a todos quantos se sentem no direito e no dever de rotular e classificar aqueles que se inspiram no liberalismo como promotores de uma ruptura histórica no CDS.

Quando a Ala Liberal procura precisamente reforçar essas linhas, convocando-as para uma actualização que é urgente, apenas procura respeitar esse legado que não pode ser negado, traduzindo-o numa alternativa de futuro para o CDS. Alternativa que passa, não pode deixar de ser, pela convivência dessas duas grandes famílias políticas. Trata-se, por isso, de traduzir um futuro que não pretende nem romper nem negar o passado, mas tão só mobilizar os democata-cristãos e liberais de Portugal.

Nada tenho contra aqueles que apenas conhecem a história do CDS de ouvir dizer ou de ouvir ler. Seria no entanto conveniente que antes de fazerem as vezes de guardiães do templo se dedicassem a estudar um pouco mais a coisa. É que, vai na volta, quem tanto se apressa a negar o evidente é quem mais se afasta do respeito pela matriz fundadora do partido.

(publicado também no A Arte da Fuga)

domingo, 24 de fevereiro de 2008

Ontem como hoje

Ignorance [about economic matters] is so profound and general that severe experiences are to be feared. The idea that there is a scheme as yet unknown but easy to find, which is bound to ensure the well-being of all by reducing work, is the dominant theme. As it is adorned with such fine terms as fraternity, generosity, etc., no-one dares attack these wild illusions

Frederic Bastiat (1801-1850)

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

Militâncias

O JMC toca no post anterior uma questão fulcral: negar a existência de uma ou várias tendências no seio do partido porque aquilo que defendem é contrário ao que, possivelmente, o partido é ou deve ser, é negar que quem subscreve essas ideias antes da existência dessas tendências não tem lugar no partido.

O único sururu que advém da criação da Ala Liberal, é porque de repente os estatutos vêm oferecer uma cobertura institucional para a existência de tendências. Isso a mim só me importa na medida em que se oferecem "regalias" às tendências que se institucionalizem com 500 assinaturas (e a única que conta, pouco mas conta, é o assento na Comissão Política Nacional do CDS). De resto, tudo como dantes.

Vejamos: eu continuo a ser o mesmo que era antes. Tão militante como antes, assim como, presumo, o JMC, o AMN, a FCP, etc, etc. Continuamos a concordar numas matérias, discordar doutras, continuamos a saber que globalmente nos somos simpáticos porque num momento ou noutro nos declaramos ou evidenciamos portadores dum ideário liberal.

Já antes éramos livres de nos organizar para apresentar documentos no seio do partido.
Já antes podíamos apresentar moções a Congresso.
Já antes éramos liberais e continuamos a ser.
E, antes como depois, somos liberais de várias maneiras diferentes.

No início era a Ala

No início era a Ala. E o problema era existir essa Ala que colocava em perigo os princípios de um partido. Como se essa Ala, que agora tinha nome, nunca tivesse existido. Como se as pessoas que a compunham nunca tivessem participado.

Mas com a constituição dessa Ala surgia, dizia-se, uma agenda escondida, umas ideias liberais a tocar o libertário, a defesa de bandeiras que ultrapassavam a esquerda pela direita e mais uns tantos mitos e fantasmas à solta.
Quando no fim a Ala apenas pretendia dar a sua perspectiva ao partido. Uma perspectiva liberal, não-socialista, não-estatizante, assente no reconhecimento e valorização do indivíduo e da sua liberdade. Uma perspectiva que não se propunha a ser o partido, nem dele ver excluído fosse o que fosse, mas sim, uma visão, entre tantas outras, da sociedade no partido.

Claro que poderia gerar confusão e discussão. Sobretudo num partido que, graças à liberdade que se pode respirar, já alberga, ao contrário do que muitos dizem, tanta diversidade.
Desde os que nele se encontram por não poderem votar mais à direita, aos que com ele misturam Estado-Igreja-Partidos, aos outros, que acreditam no suporte fundamental do Estado-providência, passando pelos saudosistas monárquicos e pelos liberais da Economia e conservadores nos costumes, até aos yuppies do consumo imediato, todos acabam por partilhar um máximo divisor comum de valores e ideias. Todos compõem um partido com possibilidades de crescer.
Mas se no início era a Ala, depois foi a própria constituição das correntes, sendo a dimensão do partido, a principal razão de crítica.

Ora a explicação reside aí mesmo: através das alas pretende-se abrir mais o partido à sociedade civil, encontrar novas caras, novas experiências, pretende-se crescer! Será errado e ilegítimo? Pretende-se quebrar com rótulos e com assombrações que vêm desde o seu nascimento e que nunca tiveram razão de ser, muito embora, nalgumas situações, se tenham agravado.
Além de que, com tanta diversidade já falada, talvez seja mais fácil trabalhar assim do que numa casa de italianos, não vos parece?

E no fim, não é natural, não é saudável existir a Ala Liberal?

Para que serve a Ala Liberal? (1)

Tive já oportunidade de destacar três posts do Rui Albuquerque no seu Portugal Contemporâneo (do céu e da terra impotência tendência liberal) sobre a enformação partidária do liberalismo e com os quais referi estar globalmente de acordo. Pretendo agora, sob a forma de resposta à pergunta que me serve de título, apresentar algumas divergências face ao que nesses posts é dito e que se prendem essencialmente com a forma como a Ala Liberal do CDS foi sendo encarada pela generalidade da blogosfera, não só mas também liberal.

A formação de uma ala liberal pressupõe necessariamente um clima ideológico que não se aproxima suficientemente do liberalismo, razão pela qual surge a necessidade de afirmar uma tendência que possa funcionar como uma espécie de inversão de uma trajectória, no sentido da aproximação ao liberalismo.


O que anima a Ala Liberal não pode ser a representação política do liberalismo, porque este não se acomoda na fileira das ideologias nem na catalogação política e partidária. O que motiva a Ala Liberal não pode ser a formação de um governo liberal, porque o liberalismo fornece um conjunto de respostas que, de certa forma, contrariam a prática governativa tal qual ela vem sendo interpretada entre nós. O que almeja a Ala Liberal não pode ser a formação de um partido liberal, porque o liberalismo fornece um conjunto de respostas que, de certa forma, contrariam a prática governativa tal qual ela vem sendo interpretada entre nós. O que almeja a Ala Liberal não pode ser a formação de um partido liberal, porque o liberalismo não convive com facilidade com projectos políticos pessoais e circunstanciais.

(já publicado no A Arte da Fuga)

Para que serve a Ala Liberal? (2)

A Ala Liberal deve constituir um ponto de encontro de todos aqueles que, dentro do CDS, comungam de um conjunto de princípios que se aproximam do liberalismo e que entendem que devem, nesse espírito, contribuir para uma intervenção política, de governo ou de oposição, que se aproxime o mais possível desses princípios.

O objectivo da Ala Liberal deverá ser o de inspirar o CDS, tanto quanto possível, à adopção de políticas que possam ser consideradas liberais. Não se trata, por isso, do meu ponto de vista, da afirmação de um programa liberal, ao estilo da mais socialista engenharia social, de transformação do Estado que temos num Estado liberal.

Diz-se que o CDS não é um partido liberal. Não tem de ser, em rigor. Aliás, essa autêntica paranóia de catalogar o CDS como sendo definitivamente isto ou aquilo é algo que me escapa, como se os partidos fossem imutáveis, cristalizados na sua fundação. Mas adiante, porque o que penso dever realçar é que, tanto quanto sei, os conservadores britânicos com Tatcher ou os republicanos americanos com Reagan nunca se assumiram como partidos liberais.

Precisamente, a função da Ala Liberal é contribuir para que o CDS, na sua intervenção política, possa produzir um conjunto interessante de propostas que atenuem, o mais possível, o socialismo reinante. O mesmo é dizer que, enquanto mera tendência, sujeita aos contextos políticos e partidários, não pode esperar-se desta Ala, como em rigor de qualquer outra, uma cristalização pura, absoluta de uma ou outra corrente liberal.

(já publicado no A Arte da Fuga)

Para que serve a Ala Liberal? (3)

O que a Ala Liberal deve ambicionar é conseguir constituir-se como um grupo de pessoas que consegue influenciar a intervenção do CDS no sentido da adopção de políticas de redução do papel do Estado e, nesse prisma político e partidário (é preciso não esquecer nem omitir), dar o seu contributo para uma superação do modelo de Estado que nos governa.

O seu desempenho só será satisfatório se existir, por parte do eleitorado uma sensibilidade acrescida para os problemas da hiper-intervenção estadual. Esse trabalho, para o qual deve Ala Liberal igualmente contribuir, deve essencialmente ser feito noutros fóruns e noutros contextos, numa intervenção social permanente de difusão dos valores do liberalismo.

Em caso algum, é esta a minha mais profunda convicção e nela me empenharei, a Ala Liberal deve surgir como prolongamento partidário desse trabalho. A Ala Liberal jamais, de forma alguma, sob pretexto algum, pode ser encarada como uma encarnação partidária do liberalismo, como penhor das soluções liberais ou como detentora exclusiva da inspiração liberal, mas deve, isso sim, como já aqui disse, ser encarada como uma tendência partidária que direcciona a sua intervenção no contexto político e partidário nacional para a superação do Estado que temos, de acordo com um conjunto importante de princípios. Nada mais do que isso. Nada menos do que isso.

Em consequência, não teremos um Estado Liberal nem um Partido Liberal por obra e graça de uma tendência partidária recém formada. Mas se pudermos contribuir, com políticas concretas, para o desmantelamento do monopólio estadual da titularidade e gestão dos interesses gerais, então a Ala Liberal já terá servido para alguma coisa.

(já publicado no A Arte da Fuga)

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

E por falar em gente de coragem...

...não perca este post do nosso querido PPM, verdadeiro exercício da mais pura liberdade e exemplo de generosidade.

Ser liberal no CDS-PP

A criação da ALA LIBERAL tem gerado uma onda de reacções ora descrentes ora agressivas. Nem umas nem outras têm razão de ser, mas creio que ambas derivam do mesmo preconceito: o de que estamos a transformar o CDS naquilo que ele não é.

Ser liberal no CDS - que tem sido um partido de liberdade, mesmo quando, em tristes momentos da história, os seus protagonistas não o souberam ser - não apresenta nenhuma contradição. Nenhum de nós, todos militantes do partido, o rejeita, rejeita o seu programa ou a sua matriz fundamental, o que quer que isso seja. Porque, valha a verdade, este partido já foi do centro, já foi do contra, já foi do povo, já foi reaccionário, já foi beato, já foi progressista, já foi liberal. Mas nunca foi de esquerda, nunca foi totalitário, nunca foi defensor do pensamento único, nunca deixou de ser um partido conservador, sempre defendeu a propriedade e a iniciativa privadas, o primado da dignidade humana e a democracia. E sempre foi um partido de resistentes e de gente de coragem.

Quase 34 anos depois da sua fundação, se quisermos ser rigorosos e sérios é este – e não é pequeno – o único património do CDS. É por isso que a institucionalização de uma corrente liberal no partido, que se proponha discutir, debater e estudar soluções que permitam a diminuição do peso do Estado na vida dos cidadãos, que permitam a diminuição da despesa pública, que permitam a redução da carga fiscal, que promovam a iniciativa individual e impulsionem o crescimento económico, nada tem de incorente ou de contra-natura.

Mas mesmo num (e a propósito de um) tão pequeno centro de poder, há sempre infinitas resistências e barreiras internas (e externas) a ultrapassar. E aqui, infelizmente, encontramos de tudo: desde os inimigos de sempre do CDS que temem o crescimento da sua influência, passando pelos velhos do restelo que já nasceram decrépitos e não percebem a dinâmica da sociedade e de como ela mudou nos últimos 20 anos, acabando naqueles que têm como projecto de vida o sucesso do seu eterno combate movido por mesquinhas razões pessoais e um incurável mau perder contra os companheiros de partido.

É a estes últimos que é especialmente penoso e díficil responder, especialmente se a calma e a racionalidade forem obrigatórias. É porque são eles que espalham o fantasma do partido dos gays, dos bacanais, do sexo em grupo, do aborto em série, da eutanásia, do fim do casamento, etc., respaldando-se no seu suposto e extremo conhecimento da verdadeira agenda dos colegas.

MAS ELES MENTEM. A nossa agenda é que consta da nossa declaração. E dela resulta, com meridiana clareza, que todos concordamos - apenas - que nem o Estado nem os partidos nem os derrotados desta vida têm nada que ver com os comportamentos privados das pessoas, desde que não contendam com a liberdade ou bem estar dos outros. É por causa desta singela ideia, que elegemos, entre outros, como ponto de partida, que alguns pobres de espírito nos julgam, nos condenam e nos desqualificam.

Essa singela ideia é a raiz das liberdades e o fundamento teórico de qualquer sistema plural e respeitador da dignidade humana. Nós, os liberais do CDS, achamos que o Estado português tem ainda um longo caminho a percorrer no aprofundamento desta singela ideia da liberdade. Caminho esse que, se trilhado, pode, na nossa opinião, aumentar o bem estar de todos, criar mais riqueza, diminuir a pobreza, o desemprego e a atrofia da nossa economia. E com isso, tornar o Homem mais feliz e mais completo.

Temos pena, mas é só esta a nossa agenda. Se concorda connosco, assine aqui.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

Porquê Liberal? (3)

As discussões políticas fazem parte da minha vida desde cedo. Com a sorte de ter amigos que se interessavem por "essas coisas" cedo fui o gajo de direita no nosso grupo - ainda que ser de direita não seja ser bicho raro aqui no Porto, mesmo entre malta nova. Daí a ter uma ideia coerente do que queria para o mundo ia um caminho longo. Foi graças à blogosfera (como aqui referi) que conheci e abracei as ideias liberais.
Blogosfera fora citavam-se ideias e livros que me eram desconhecidos, mas apelativos. Lembro me particularmente do António Costa Amaral ter o hábito de citar obras. E a vantagem dessa obras, as liberais, é que estão disponíveis gratuitamente online.
Comecei por ler um livro curto e conciso sobre Economia que, apropriadamente, se chama "Economics in One Lesson", do jornalista-economista Henry Hazlitt. Daí passei ao livro em que Hazlitt se inspirara: Ce qu'on voit et ce qu'on ne voit pas, que li em inglês (pdf).
A partir daí foi um sem-número de obras disponíveis para aqueles que se querem auto-ensinar nas artes da Economia e da filosofia liberal. (A obra completa de Bastiat é imperdível, vol.1, vol.2) Talvez tenha oportunidade de postar aqui alguns ensaios curtos.

E enfim, assim nasceu um liberal num país constitucionalmente socialista. Os caminhos possíveis para tirar o país desse marasmo do pensamento único serão vários, e não haverá uma fórmula milagrosa. Tentemos algumas aqui. Se for militante do CDS e lhe for simpática a ideia, assine a petição aqui.

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

Porquê Liberal? (2)

Antes de mesmo saber ao certo o que pensar da política já votava no CDS. Não sei hoje reconstruir porquê. Acho que tinha que ver com a minha visão positiva da CDU alemã, país cuja política acompanhava e acompanho com muito interesse. Foi aliás por causa da Alemanha que me apareceram as primeiras fúrias liberais. Não me esqueço do dia em que Gerhard Schröder, chanceler alemão à data, entrou na Phillip Holzmann (construtora civil alemã) e saiu como salvador dos empregados que se manifestavam à porta contra a falência da mesma. Dois anos depois, sabe Deus com quantos Marcos de dinheiro dos contribuintes e a Holzmann faliu na mesma. Na altura cheirou-me a esturro e fiquei incomodado com toda a popularidade que o chanceler tirou do seu acto heróico. Heróico e social.
É fácil ser herói com o dinheiro dos outros.

Houve outra coisa que me fez juntar ao CDS. A autobiografia do Professor Freitas do Amaral. Ainda que escrita já depois do seu afastamento do CDS, o livro retrata bem como era difícil um partido portar-se de forma decente no pós-25-de-Abril. Tenho para mim que foi o CDS o único que o conseguiu.
Claro que esse CDS é outro do de hoje em dia, e isso eu não percebia na altura. Era o CDS que governava com o PSD como governava com o PS. O CDS que se queria de centro. No entanto a leitura da história da fundação do partido trouxe-me para o lado daqueles que vejo como herdeiros dum espírito de luta pela liberdade em momentos em que isso era pago com difamação, prisão e perigo de vida.

Já depois de uns anos de militância na Juventude Popular, a experimentar a democracia-cristã (lá está a influência da CDU) - para descobrir que a democracia-cristã em Portugal é uma espécie de social-catolicismo que não me atrai - passando pelas drogas pesadas do conservadorismo - demasiadas vezes saudosista de tempos que não me interessam -, vim dar a um pensamento coerente e atraente. Diferente do discurso habitual. Lógico e intrigante. E curiosamente não foi dentro do CDS ou a da JP que me converti.
Se me tornei liberal devo-o aos blogues.

continua

Porquê Liberal?

Enquanto espero que se juntem outros colaboradores aqui ao blogue, vou maçar os nossos leitores a tentar explicar porque diabo achei um dia que havia de ser liberal.

Colar etiquetas destas (a nós próprios ou a outros) pode ser perigoso. Vê-se no PS, vê-se na blogosfera liberal e via-se na oposição ao Estado Novo: uns são mais socialistas, outros são os verdadeiros liberais, ainda outros foram a verdadeira oposição. Para facilitar definirei liberal por aquilo que não é: no que eu conto como o espaço liberal enquadram-se todos os que não são socialistas. Dito por outras palavras, todos os que não acreditam que deve ser a comunidade, o estado ou o governo a controlar a propriedade, os meios de produção, a economia em geral. Juntando a isto uma noção profunda de liberdades individuais de expressão, pensamento e afins estão encontrados os que chamo de liberais. Como tal não aspiro a que me colem um rótulo de ser seguidor desta e daquela escola de pensamento, deste e daquele filósofo, economista, etc. Que digam de mim que não sou socialista que me dou por feliz.

E postas assim as coisas, poderíamos ficar contentes: não-socialistas devia haver muitos em Portugal. Pois mas não há. Que servisse esta nossa conglomeração para demonstrar isso, e já teria feito um enorme serviço ao país. BE, PCP, PS, PSD são tudo partidos vincadamente socialistas. Só o CDS pode ter uma intervenção liberal, o que aliás pode (e penso que deve) acontecer sem tornar o CDS num partido liberal.

continua